BAHIA
“Quem não tiver apoio de Lula vai passar maus bocados”, diz Éden
Presidente do PT-BA deu entrevista ao Portal A TARDE e falou sobre seu futuro político
Por Lula Bonfim

Está se encerrando o ciclo de Éden Valadares no comando do PT na Bahia. Ligado ao senador Jaques Wagner (PT-BA), o atual presidente da legenda no estado decidiu que não concorrerá à reeleição, argumentando que é o momento de dar espaço para a renovação no partido.
Durante seu mandato, Éden foi participativo nas discussões políticas da Bahia e do Brasil, sempre com algum comentário ácido em direção à oposição no estado. Apesar disso, ele garante que ainda não é pré-candidato a nenhum cargo eletivo.
“Aprendi com meu companheiro Valmir Assunção que candidatura não pode ser algo que nasça da vontade do candidato, e sim de um coletivo, de uma ideia, ou da defesa de um projeto. Insisto: meu foco é cumprir meu mandato e coordenar a eleição interna mais democrática, com maior participação da base do PT e que produza a maior unidade possível”, assegurou Éden.
Durante entrevista concedida ao Portal A TARDE, o presidente estadual do PT também avaliou os desempenhos dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de Jerônimo Rodrigues (PT), além de aproveitar para alfinetar o principal opositor do petismo na Bahia: o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (União Brasil).
“Ele já é isolado. Não preside o partido dele, não tem função pública, teve as contas da fundação que presidia questionadas na Justiça pelo próprio DEM [União Brasil] e não tem uma referência nacional para chamar de sua. Na Bahia, quem isola ele não é ação de governo, é sua prepotência e arrogância”, cutucou.
Confira abaixo a entrevista completa:
Na última vez que você falou com o A TARDE, disse que ainda não havia decidido sobre uma possível candidatura à reeleição à presidência do PT-BA. Passado o Carnaval, houve tempo para analisar a conjuntura, conversar com a família e chegar a uma decisão?
Sim. É uma decisão pessoal, muito conversada em casa com a família, mas também política. Eu fui eleito para um mandato de quatro anos e, por decisão do Diretório Nacional, meu mandato foi estendido para seis anos. Disputar um novo mandato poderia significar ficar dez anos na presidência do PT. E isso eu acho demais. Minha chegada à presidência significou uma importante renovação no PT e esse processo não pode parar ou retroceder. É preciso dar oportunidade para que um novo quadro, um novo dirigente, tenha oportunidade de continuar esse processo de promoção de novas lideranças e de renovação do partido. Além do mais, aprendi com Zezéu [Ribeiro] e Wagner que, na política, a gente não pode ter apego aos cargos. A gente cumpre ciclos e renova novos desafios. Josias cumpriu o ciclo dele, Jonas, Everaldo, agora eu cumpri, e é chegada a hora de dar oportunidade ao novo. A direita promove isso de forma hereditária, de pai para filho, para neto. No PT, esse processo é feito pelo caminho da democracia e participação direta dos filiados. O maior orgulho da minha vida são meus filhos e minha família. Junto a isso, a oportunidade de presidir o PT. Vou seguir com muita honra cumprindo meu mandato até o final e apostando no processo necessário, fundamental, eu diria, de renovar o PT.
A gente sabe que, desde sua fundação, o PT possui divisões internas, que acabaram se consolidando nas chamadas tendências partidárias. Em 2023, alguns desses grupos reclamaram de uma suposta perseguição sua no partido. Como está a relação interna no PT hoje? O partido está pacificado na Bahia?
Eu fui eleito com um programa que incluía o resgate da democracia interna, com maior funcionamento das instâncias, com debate aberto e sem tabus. Mas também com o saneamento e transparência das finanças partidárias, fortalecimento da organização interna. Por exemplo: nunca estivemos organizados em tantos municípios com nossas comissões provisórias e diretórios municipais. E com uma forte atualização das formas, linguagens, estéticas e meios de comunicação do PT com a sociedade. Penso que perseguimos e alcançamos estes desafios. Não é fácil inovar e é preciso reconhecer o papel que meus colegas de direção tiveram ao meu lado. Não vou citar para não cometer injustiças. Mas devo a cada um deles essa caminhada. Ninguém faz nada sozinho e muita gente, que sabe o que estou dizendo, vai se reconhecer. A começar pelos funcionários do partido, nossa Executiva, dirigentes e a militância do PT, nosso maior patrimônio. Críticas têm, claro. É da natureza do PT. Eu sou filho do PT, nascido e criado no partido e sei lidar com críticas e elogios. O segredo é não se abater quando alguém exagera nos ataques, até porque muitos deles partem da natural disputa interna, mas também não deixar que a vaidade suba à cabeça quando os elogios chegam. Com relação à pacificação, o conceito de obediência silenciosa não combina com o DNA [do PT]. Nós somos um partido ousado, questionador, inquieto e em disputa. Disputamos internamente nossas ideias e opiniões, disputamos na sociedade em defesa dos nossos valores e princípios. Portanto, é mais do que natural no PT. Faz parte da nossa formação e propósito.
Para além de ser presidente estadual do PT, você é um quadro muito ativo na política da Bahia, sempre participando dos debates de maneira pública, colocando seus posicionamentos de maneira firme. Ao mesmo tempo, você nunca ocupou um cargo eletivo. Isso está nos seus planos para 2026?
Vamos falar de futuro quando ele for mais presente? Repare, como eu disse, eu sou filho, nascido e criado no PT. Por conta dessa militância, já cumpri tarefa no movimento social, no movimento estudantil, no governo do estado, no governo federal, há seis anos com muita honra, honestidade e dedicação à direção do PT e, é verdade, ainda não topei ser candidato nas urnas, por assim dizer. Mas aprendi com meu companheiro Valmir Assunção que candidatura não pode ser algo que nasça da vontade do candidato, e sim de um coletivo, de uma ideia ou da defesa de um projeto. Insisto: meu foco é cumprir meu mandato e coordenar a eleição interna mais democrática, com maior participação da base do PT e que produza a maior unidade possível. Tenho certeza que as correntes, as forças internas do PT apresentarão ótimos nomes, qualificados para essa missão de seguirmos renovando nossa luta e que, desse processo, sairemos com a maior unidade possível. Vou me dedicar a cumprir meu mandato. Em qual tarefa estarei depois disso, se nas urnas, no governo, no movimento, isso o tempo e o debate coletivo é que dirão.
Sei que há um grupo de WhatsApp com militantes petistas que acabou ganhando o nome de “Menudos”, em referência a uma matéria do Grupo A TARDE. Você integra esse grupo? Já está consolidado o apoio desse grupo à candidatura de Lucas Reis à deputado federal? Existem outras possibilidades?
O processo de renovação geracional no PT é estimulante, mas também desafiador. Quando Wagner apoiou Rui Costa para o governo foi um desafio e tanto. Quando o PT apresenta Jerônimo em 2022 ainda mais. É natural que a cada momento desse haja reação negativa, uma certa desconfiança e até torcida contra. Natural. Mas esse desafio deve nos estimular e nunca abater. Quantos comentários preocupados com as escolhas de Jerônimo para o secretariado ouvimos? E hoje companheiras da qualidade de Rowenna, Roberta, Adolpho, Felipe, Osni, Bruno Monteiro são reconhecidos pelo seu trabalho e competência. E esse processo acaba influenciando o PSB com Hita, o PCdoB com Ângela e Augusto. Que bom! Repare, a extrema-direita desafia todos os países democráticos com uma onda que combina extremismo político, com negacionismo científico e ambiental, revisionismo histórico, fundamentalismo religioso e um nacionalismo carregado de preconceito contra a diversidade social, sobretudo com os negros e negras, as mulheres, a comunidade LGBTQIA+, os mais pobres como um todo. Então a esquerda precisa se reinventar e renovar. Não é uma coisa só da Bahia ou do Brasil. É global. E tomara que mais Lucas, Rowennas, Robertas, Felipes e — me permita — Édens também venham. Marco posição, respondo e debato com ACM Neto e os seus porque a sociedade baiana precisa saber que há contraponto, há enfrentamento e um outro jeito de pensar, enxergar e fazer política do que apenas os deles. E que mais e mais gente possa se destacar nessa tarefa. Aprendendo e honrando que nos trouxe até aqui, mas também desbravando novos caminhos, novas batalhas.
O presidente Lula vive um momento delicado de sua aprovação popular, em meio a problemas de comunicação, inflação de alimentos e também informações falsas. Em meio a essa crise, Lula levou o baiano Sidônio para a Comunicação Social e alçou Gleisi Hoffmann para as Relações Institucionais. Como você avalia o cenário federal?
Pesquisa de opinião não pode ser celebrada nem rejeitada. É retrato de momento que pode nos dar pistas de onde estamos acertando ou errando. Penso que temos dois desafios nessa sua pergunta. O primeiro é entender como fazer política e comunicação em tempos de tanta mentira, manipulação e fake news. Repare nessa cena. O trabalhador que conquistou o emprego de carteira assinada ou a mãe que acabou de levar seu filho para uma escola de tempo integral, as duas medidas do governo Lula, voltam para casa bombardeados pelo zap da vida, com conteúdos e memes que os levam a crer que sua vida piorou, 24h por dia. O segundo desafio, penso eu, é recalibrar o paradigma da comunicação. Lula 2022 não pode, não deve, ser comparado a Lula 2002. O Brasil mudou, o mundo mudou abruptamente. O Brasil de Lula deve ser comparado ao Brasil de Bolsonaro. E isso melhorou demais. Aliás, quem é bolsonarista e viu um país celebrar nas ruas seu orgulho de ser brasileiro, com a conquista do Oscar sobre um filme que denuncia a ditadura, não deve ter tido um bom Carnaval.
Por outro lado, o governo Jerônimo tem observado o crescimento de sua aprovação popular nas pesquisas. A que vocês creditam esse avanço na avaliação de Jerônimo, especialmente no interior da Bahia?
O que vale para Chico, vale para Francisco. Não é o caso de comemorar pesquisa. Mas de estudar, mergulhar e tentar entender cada vez mais o sentimento do povo. No caso de Jerônimo, eu penso que há o elemento da surpresa positiva que conta a nosso favor, pois muita gente não conhecia Jubiabá, como a gente chama ele. Não sabia como ele era e fica positivamente impactado com seu carisma, sua intensa dedicação e seu volume de trabalho e entrega. Não tenho dúvida em dizer que Jerônimo fez os dois primeiros anos de governo ainda melhores do que foram os dois primeiros de Wagner ou de Rui. E também porque a sociedade baiana, a classe política, os prefeitos, movimentos sociais, começam a entender o tipo de governo e de governador que a Bahia tem. Jerônimo é um cara do interior, nascido em um povoado, ou um distrito, como dizem, que faz a administração mais próxima do povo que ele pode fazer. Então quer encontrar o governador? Não vá ao palácio. Vá para a rua. Ele vai estar entregando obra, serviço, fazendo vistoria, visitando e dialogando com o povo. Jerônimo faz do seu governo um gabinete de rua, presente, na ponta. E acho que essa percepção começa a aparecer. Na pesquisa e nas ruas.
Nas últimas eleições, a gente viu um desempenho do PT Bahia muito atrelado ao desempenho das candidaturas do PT à presidência da República. A queda na avaliação de Lula preocupa em relação à reeleição de Jerônimo?
Lula é o melhor presidente que o país já teve. Para o Brasil e para a Bahia. E o povo baiano sempre dedicou seu carinho, reconhecimento e votação a Lula. Pesquisa, como te disse antes, não é definidora. Se fosse, o PT Bahia não teria vencido nenhuma das últimas cinco eleições. Vamos dar tempo ao tempo. Lula seguirá sendo o grande eleitor da Bahia e quem não tiver seu apoio vai passar maus bocados. Ou fingir o ‘tanto faz’.
Durante a campanha eleitoral de 2024 nos municípios, houve alguns casos em que o governo Jerônimo apoiou abertamente candidaturas rivais a candidatos do PT. Como foi lidar com isso como presidente do PT-BA?
Nestes seis anos à frente do PT, eu pude coordenar duas campanhas municipais e uma estadual, a sucessão do governador Rui Costa e consequente eleição do companheiro Jerônimo. Posso te dizer com tranquilidade que em mais de 90% das cidades a nossa tática eleitoral foi combinada com o governo. Jerônimo é o governador que mais fez campanha para o PT. Visitou mais de setenta cidades em comícios e carreatas, ajudou a organizar a disputa e as nossas 50 vitórias, e gravou para mais de 100 candidatos do PT. Mas é claro que teve problema e negar isso não é da minha personalidade, nem da formação que recebi de Dona Iva, minha mãe, ou daqueles com quem aprendi a conhecer e defender o PT. Debati isso nas bancadas, com Zé Raimundo, Fátima Nunes, Rosemberg, Marcelino Galo, Waldenor, Josias. E quando se acaba colocando um cara como Jerônimo, que tem enorme sintonia e identidade com PT, em outro palanque, é ruim. A militância não tem obrigação de entender. Entendo e sou solidário a esse sentimento. O caso aí é de olhar para a frente, checar onde erramos, tanto o PT quanto o governo, e tirar aprendizado disso para não acontecer mais.
Neste momento, a gente observa o governo Jerônimo avançando pelo interior do estado e ganhando apoios de prefeitos que foram eleitos pela oposição, de partidos como PP e até União Brasil. O objetivo é isolar ACM Neto na capital?
ACM Neto é isolado no Brasil. O candidato dele na eleição passada foi Bolsonaro, mas ele não teve coragem de admitir. Tentou a coisa do ‘tanto faz’ e perdeu uma eleição que ele considerava ganha. Repare, isso não é uma opinião minha, é fato, com declaração pública do atual prefeito de Salvador, dizendo em entrevista que nunca votou no PT. Nem no segundo turno das eleições passadas para presidente. É só procurar na internet aí. Mas, voltando para sua pergunta, ninguém aqui faz política querendo isolar ACM Neto. Ele já é isolado. Não preside o partido dele, não tem função pública, teve as contas da fundação que presidia questionadas na Justiça pelo próprio DEM [União Brasil] e não tem uma referência nacional para chamar de sua. Na Bahia, quem isola ele não é ação de governo, é sua prepotência e arrogância. O governo não pode e nem deve dar tratamento especial para quem apoiou ACM em detrimento de quem comeu sal e poeira com a gente esses anos todos. E eu estou lutando, brigando, tentando proteger os nossos. Mas a verdade é que muita gente, muita liderança, larga o lado de lá e vem para cá por causa do padrão de diálogo e atendimento. ACM Neto se isola por conta própria.
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