FRUTAS QUE DÃO FRUTOS
Produtos derivados abrem novos mercados na Bahia
Cooperativas locais comemoram expansão dos negócios e do volume de vendas
Cerveja de umbu, cajá ou caju; cafés em grãos e moídos; bombons de chocolate com cupuaçu; pastas de castanhas de caju; abacaxi desidratado; geleias e doces de frutas. Produtos derivados da fruticultura da Bahia – boa parte produzida por famílias agrícolas – são apreciados dentro e fora do território baiano. Com produção diversificada, de qualidade e baseada em princípios agroecológicos, as cooperativas mostram capacidade de abrir novos mercados e expandir a comercialização por meio de ações apoiadas pelo governo do estado e geridas pela União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes).
O cenário positivo da fruticultura na Bahia é celebrado pelos cooperados. É o caso do pequeno produtor Aderval Queiroz da Silva, que até março deste ano era presidente da Cooperativa de Pequenos Produtores de Abacaxi (Coopaita). “O setor tem ampliado muito, principalmente de 2019 a 2024, com o apoio da CAR [Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional] para a aquisição de máquinas, como trator, e equipamentos voltados à energia solar, forno de desidratação e câmaras frias, em parceria com o Banco Mundial. A questão climática também vem ajudando, pois as chuvas aumentaram nos últimos anos”, pontua.
Em Itaberaba, onde está sediada a Coopaita, o crescimento do plantio de abacaxi foi de 30% a 40% em comparação a 2023, batendo o recorde na Bahia. “Relevante dizer que 95% da produção de abacaxi do município estão nas mãos de produtores familiares e, no ano passado, a cidade produziu 20 milhões de abacaxis, que foram comercializados em todo o País”. Pelas mãos de 120 famílias ligadas à Coopaiba, a fruta in natura se transforma em abacaxi desidratado.
“Comercializamos nossos produtos derivados do abacaxi para todo o Brasil e já chegamos em Portugal, através da parceria com a Unicafes. Estamos com nova embalagens das nossas marcas: Golden Fruit e Coopaita Premium. Temos também uma grande parceria com a indústria Tia Sônia, de Vitória da Conquista, e em Salvador, vendemos no empório do Rio Vermelho e outras lojas de produtos naturais”, conta Aderval, acrescentando que a cooperativa produz ainda banana, manga, limão, laranja e jaca.
O caju, originário da faixa litorânea brasileira e que se espalhou por várias regiões do País, é outra fruta que gera inúmeros produtos. Com a participação de 750 pessoas, a Cooperativa da Cajucultura Familiar do Nordeste da Bahia (Cooperacaju), de Ribeira do Pombal, movimenta a produção de castanha de caju natural, torrada, frita e com banana e abacaxi desidratados, além de cerveja de caju e pasta de castanha integral com cacau ou licuri, que são vendidos no setor privado, atendendo clientes de municípios próximos e do Nordeste, bem como de outras regiões, como Foz do Iguaçu, Curitiba e São Paulo.
“O nosso e-commerce também contribui, expandindo nosso público”, conta o presidente da Cooperacaju, Ícaro Rennê. A bem sucedida fabricação de derivados, afirma, se deve à modernização na produção de frutas. “Estamos passando por grandes mudanças, e o setor tem crescido significativamente com a tecnificação de toda a produção no campo, a partir de sistemas mais eficientes. Com a abertura de mercados para produtos in natura e beneficiamento de frutas em agroindústrias da agricultura familiar, a produção tende a aumentar, gerando mais renda para os agricultores familiares. O cenário atual é promissor”, avalia.
Rennê destaca ainda o apoio da CAR, através de recursos e orientações aos produtores. O órgão também oferece oportunidades de networking e conexões com outras cooperativas e profissionais de diversas áreas. “Além de investimentos em contratação de equipe especializada, também recebemos investimentos em maquinários, ampliações fabris e veículos que facilitaram a logística”, enumera.
Do café que produz, a Cooperativa Mista dos Pequenos Cafeicultores de Barra do Choça e Região (Cooperbac) fabrica o Café para Comer - doce de chocolate com recheio de café. A presidente da Cooperbac, Joahra Oliveira, ressalta que a cafeicultura na Bahia tem crescido muito, principalmente na agricultura familiar, por conta dos incentivos que os pequenos produtores vêm recebendo do governo do estado e de ONGs, desde a fase da qualificação do campo até a comercialização, passando pela agroindustrialização. “Os agricultores da nossa cooperativa estão aplicando tecnologia no campo, produzindo café de qualidade. Os 320 associados produzem 230 mil sacas por ano do café arábico e conilon”.
O diretor-presidente da CAR, Jeandro Ribeiro, afirma que o órgão busca fortalecer a fruticultura de base familiar com investimentos que ultrapassam R$ 200 milhões. “Temos fomentado o acesso a novos mercados institucionais, bem como privados, a exemplo das grandes redes de supermercados. Para isso, são realizados investimentos significativos na apresentação dos produtos, por meio de embalagens adequadas para atender aos requisitos do mercado, abrindo oportunidades antes inimagináveis para agricultores familiares”, pontua.
Delícias do Norte Semiárido
Em 1983, quando aportou em Juazeiro, no Vale do São Francisco, vindo de Mogi das Cruzes (SP), onde cresceu, o japonês Suemi Koshiyama tinha 30 anos, muitos planos e vontade de desenvolver projetos voltados para a fruticultura irrigada. Começou plantando 2 hectares, como parte de uma cooperativa. Depois de dez anos, criou a empresa Special Fruit e hoje o empreendimento conta com cinco propriedades que somam mais de 1.100 hectares, empregando uma média de 2.500 pessoas.
“Na fruticultura, cerca de 60% do valor do custeio é para a mão de obra, o que reflete na economia pela distribuição de renda que eleva o poder aquisitivo da população, desenvolvendo setores como comércio e serviços. Isso é muito evidente na nossa região”, enfatizou.
Nas quatro décadas que labuta no Norte baiano, Suemi Koshiyama contou com os resultados de pesquisas para seleção de variedades adaptadas e sistemas que potencializem as características climáticas do Semiárido, aproveitando o São Francisco. O diferencial positivo da região é a possibilidade de produzir o ano todo com a floração induzida.
“Com isso, conseguimos atender as janelas do mercado, com frutas fresquinhas e saborosas”, afirmou, exemplificando que nos meses muito frios no Sul do Brasil e em outros países, as frutas tropicais têm grande procura e são valorizadas por estes mercados consumidores. Ele ressaltou que o maior desafio da sua produção é oferecer o melhor sabor “para criarmos memórias afetivas daquela fruta, fazendo com que a pessoa volte a comprar”.
Da uva produzida, Suemi Koshiyama exporta 50% e 90% da manga para a América, Europa e parte da Ásia. “Os fruticultores têm grande participação no desenvolvimento socioeconômico de uma região”, salientou Koshiyama, pontuando ser importante a otimização da infraestrutura de escoamento para que os fretes sejam justos e os produtos cheguem ao destino em boas condições.
Estado conquista mercado de vinhos finos de qualidade
Do cultivo das uvas viníferas à fabricação do vinho, são muitos os processos que influenciam na cadeia produtiva e, consequentemente, na qualidade da bebida. Atualmente, grande parte da ‘bebida dos deuses’ é produzida em escala industrial. A Bahia, que se garante como quarto maior produtor de uva, com um cultivo, em 2023, de 75.664 toneladas da fruta, vem conquistando o mercado representado por vinícolas da Chapada e do Vale do São Francisco.
A diversidade climática da Bahia permite a produção de uma ampla gama de vinhos, desde os mais encorpados e tânicos aos mais leves e frutados. Rafael Bezerra, sócio e diretor da Vinícola Reconvexo, em Morro do Chapéu, no terroir da Chapada Diamantina, assegura que, com clima ameno, altitudes elevadas e solos adequados, a região tem se mostrado promissora para o cultivo de variedades de uvas viníferas, especialmente voltadas à produção de vinhos finos, e vem conquistando reconhecimento nos mercados nacional e internacional. “O município tem se destacado como um importante polo vitivinícola na Bahia. As seis vinícolas existentes estão investindo na produção de qualidade, aproveitando as condições climáticas e geográficas”.
Professor universitário, Bezerra conta que tem incentivado a formação na região. “Seria fantástico se tivéssemos uma escola técnica de viticultura e enologia na Chapada”, pontua.
Com a experiência de muitos anos de prática, Odilesio Cortes dos Santos, supervisor da Reconvexo, explica que o processo de vinificação – conjunto de procedimentos para a transformação da uva madura em vinho – começa com a limpeza e sanitização dos equipamentos e, em seguida, a seleção manual das bagas - grãos da uva - estragadas. “Temos que fazer um desengace, que consiste na separação das bagas do engaço [sustentação do cacho] antes do esmagamento, para só depois colocá-las em um tanque para iniciar a fermentação”, orienta o colaborador da vinícola que, entre 2022 e 2023, produziu 9 mil garrafas.
O empresário Jairo Vaz, da Vinícola Vaz, também em Morro do Chapéu, ressalta que a Bahia não dispõe de estatística específica sobre produção de vinhos. “Podemos estimar, através da produção anual de 70 mil toneladas, que 10% se destinam a sucos, vinhos e espumantes, sendo produzidos cerca de três milhões de litros de vinhos finos e espumantes”, afirma o dono da vinícola, que produz 25 mil garrafas de vinhos por ano.
O Vale do São Francisco se destaca na produção de espumantes com alta produtividade das uvas e capacidade de fabricação durante todo o ano. Já a Chapada, com colheitas distintas no verão e no inverno, se notabiliza em vinhos tintos e brancos, com características próprias de um novo terroir. “A Chapada vem obtendo reconhecimento nacional ao ter seus vinhos premiados em importantes eventos. Também os espumantes do Vale do São Francisco foram premiados em concursos internacionais de renome”, pontua Jairo Vaz, frisando que o Testardi, produzido em 2012, pelo Grupo Miolo, foi considerado o melhor vinho tinto brasileiro.
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