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A Tarde Memória

Por Cleidiana Ramos*

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 13 de julho de 2024 às 0:00 h | Autor:

Feira das Sete Portas foi inaugurada como opção de preços baixos

Edição de A TARDE fez relato detalhado da festa que contou com a participação do então prefeito de Salvador, Francisco de Souza

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Feira das Sete Portas é um dos mais fortes centros comerciais de Salvador
Feira das Sete Portas é um dos mais fortes centros comerciais de Salvador -

Há 94 anos um dos equipamentos culturais mais vibrantes de Salvador, a feira, ganhou um reforço. Em junho de 1930 foi inaugurada a Feira das Sete Portas. Segundo a reportagem publicada em A TARDE, o novo espaço comercial chegou para oferecer produtos mais em conta.

“A inauguração, hontem, da feira livre da Sete Portas, constituiu uma nota nova para a cidade. Manhã cedo, o largo apresentara interessante aspecto todo embandeirado ostentando as barraquinhas bem preparadas e os taboleiros para verduras e frutas tudo de acordo com as exigências do regulamento da Prefeitura, tendo acorrido ao local cerca de 100 vendedores vindos de Saboeiro e Cabula”. (A TARDE, 23/06/1930, p.2).

A inauguração contou com a participação do então prefeito de Salvador, Francisco de Souza que disse ver na feira a possibilidade da oferta de produtos mais baratos.

“Depois de declarar que a Prefeitura visava com as feiras facilitar à população pobre a aquisição de gêneros mais baratos disse que prestava todo o seu apoio a essas iniciativas cobrando taxas mais módicas do que as do Districto Federal, apenas exigindo barracas decentes e taboleiros de acordo com as instruções baixadas”. (A TARDE, 23/06/1930, p.2).

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Doutor em Ciências Sociais e professor titular aposentado da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Ericivaldo Veiga indica, em uma análise da reportagem de 1930, indícios do que pode ser a preocupação com o caráter social da alimentação, que no futuro se desdobrou em políticas públicas mais específicas.

“Tem o discurso político de que serão encontrados alimentos mais baratos. Mais tarde podemos observar como o Estado em seus vários âmbitos vai buscar estabelecer políticas para facilitar o consumo de produtos alimentares sobretudo os básicos”, destaca Ericivaldo Veiga.

Dinâmicas

As primeiras décadas do século XX em Salvador foram marcadas por dificuldades para o abastecimento de alimentos e altos preços, especialmente de carnes. A população mais pobre era atormentada pelo chamado “problema da carestia”, como é noticiado em seguidas reportagens de A TARDE do período. Havia tensões constantes entre prefeitura e fornecedores de alimentos devido a políticas de tabelamentos de preços, o que inclusive gerou uma greve das fateiras em 1937 que foi tema desta coluna na edição de 13 de novembro de 2021. Uma das maiores políticas do governo de Octávio Mangabeira no final da década de 1940 foi um plano mais amplo voltado sobretudo para o abastecimento de carne.

O professor Ericivaldo Veiga, que tem vários trabalhos no campo da antropologia da alimentação, também aponta as características de culturas efervescentes no ambiente das feiras, sobretudo nas práticas alimentares dinâmicas e diversas. Na feira não apenas se compra alimentos, mas se consome as refeições, se reforça redes de sociabilidade e se encontra praticamente tudo que se procura ou a forma para se chegar até aos produtos mais difíceis.

Esse dinamismo continua na Sete Portas. Há ampla variedade de produtos relacionados aos ritos das religiões de matrizes africanas, mas ela também é conhecida por ser um ponto onde se acha preferencialmente material para conserto de equipamentos domésticos, como os fogões. Também se toma o famoso café da manhã das feiras com cardápio como feijoada, mocotó, rabada, dentre outros pratos que passam bem longe do formato mais frugal como algumas pessoas encaram essa primeira refeição do dia.

  • Feira das Sete Portas é um dos mais fortes centros comerciais de Salvador
    Feira das Sete Portas é um dos mais fortes centros comerciais de Salvador |
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Na década de 1980, a Sete Portas ficou famosa por funcionar durante a madrugada. Era um serviço diferenciado em relação às outras feiras da cidade.

“Uma feira livre em plena madrugada. É na noite de sexta-feira, no Mercado das Sete Portas, onde homens, mulheres, gente vinda de todos os bairros se mistura para adquirir a verdura fresquinha que chega nas carroçarias dos caminhões, no interior das kombis ou em carrinhos de mão, trazida por verdureiros que se previnem com uma noite de antecedência para enfrentar a demanda do sábado pela manhã, quando a feira recebe maior número de consumidores”. (A TARDE, 8/12/1981, p.12).

Em meio à tanta ebulição o comércio se estendia aos boxes que funcionavam como bares e que ofereciam inclusive as comidas e bebidas consideradas afrodisíacas.

“Os mais prevenidos fazem tudo de uma vez e ainda aproveitam o tempo para acabar a noite no bar do "Popular 49", ou no restaurante "Alagoano", que funcionam até as primeiras horas da manhã comercializando bebidas e, principalmente, os exóticos pratos baianos, indicados, inclusive, como eficientes remédios para fraqueza e até impotência sexual”. (A TARDE, 8/12/1981, p.12).

A feira é tão diversa e impressionante que funciona dentro de um mercado homônimo, mas ainda se espalha para além das calçadas. É de menor proporção que São Joaquim, mas ao lado desta resiste às dinâmicas do tempo. Já teve ao que parece as fases de administração pública, da categoria dos barraqueiros e a particular. Seu período inicial como mercado é estabelecido a partir do início da década de 1940.

“O Mercado das Sete Portas é um desses templos de festa para os sentidos. Junto com a Feira de São Joaquim, resiste às mudanças. O centro comercial que funciona como uma feira, abastece boa parte da população que mora em Nazaré, Brotas, Pelourinho e Barbalho”. (A TARDE, 12/06/2003, p.6).

Assim como São Joaquim é referência na região de chegada à Cidade Baixa, a Sete Portas é a ligação com uma área da cidade que já teve importantes equipamentos como a Rodoviária. No local deste antigo equipamento de transbordo está o Mercado Sete Portas, que atualmente é administrado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado da Bahia (SDE). O espaço tem serviço de vendas de verduras, legumes e hortaliças-sacolão- e uma área anexa com cerca de 50 barracas. Esta feira acontece diariamente todos os dias nas madrugadas e possui 13 unidades para bares e restaurantes.

Chamada de feira, de mercado e às vezes provocando confusões e dúvida por conta de tantas características e histórias, a Sete Portas continua com seu lugar de importância no imaginário social da cidade. Como uma boa feira baiana tem os atalhos, as melhores referências para um tipo de serviço e a garantia de que só se acha determinado produto- a farinha, o camarão, a folha certa para o banho-, naquela barraca que já está na sua terceira geração de administradores. São códigos de universos que, na capital baiana, não se esgotam no pragmatismo.

Confira as páginas de A TARDE:

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*Cleidiana Ramos é jornalista e doutora em antropologia

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