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Mineirinho: "Quero aproveitar enquanto Gabriel não acorda"

Publicado domingo, 07 de junho de 2015 às 10:01 h | Atualizado em 21/01/2021, 00:00 | Autor: Diego Adans
Adriano 'Mineirinho' de Souza (líder do Circuito Mundial de Surfe)
Adriano 'Mineirinho' de Souza (líder do Circuito Mundial de Surfe) -

Líder disparado do Circuito Mundial de Surfe (WSL), o paulista Adriano de Souza, o Mineirinho, tenta manter, a partir de hoje - quando se inicia a 5ª etapa, em Fiji -,  além da ponta da tabela, a esperança da conquista de seu primeiro título mundial. Façanha alcançada ano passado pelo também brasileiro Gabriel Medina. Antes do embarque para Fiji, Mineirinho concedeu entrevista exclusiva ao A TARDE. No bate-papo, o bem-humorado surfista comentou dentre outros assuntos sobre a repercussão da temida 'Brazilian Storm (Tempestade Brasileira)' no surfe mundial. Ao todo, são sete surfistas: o próprio Mineirinho, Gabriel Medina, Filipe Toledo, Miguel Pupo, Jadson André, Wiggolly Dantas e  Ítalo Ferreira. Com 26.250 pontos conquistados, Mineirinho é o atual homem a ser batido. Filipe Toledo, com 25.700, e o australiano Mick Fanning, com 20.950, perseguem o paulista de 28 anos. O atual campeão mundial, Gabriel Medina, e a lenda norte-americana Kelly Slater ainda não engrenaram. O brasileiro está em 19º, com 9.200 pontos. Já Slater figura em 13º, com 12.700. Para Mineirinho, tanto Medina quanto Slater ainda vão melhorar. Orgulhoso por ser o atual nº 1 do mundo, Mineirinho cobrou: "Falta um convite para eu ir surfar aí na Bahia".

Você lidera o Circuito Mundial e, curiosamente, em 2015, completa dez anos de carreira na elite do surfe. Está sendo o seu melhor ano no esporte?

Com certeza. Eu nunca estive tão confiante e feliz com meu surfe. Sinto que hoje, devido à experiência adquirida por todos esses anos, eu passei a conhecer alguns atalhos. Mas ainda falta muito e espero poder falar no final do ano que foi o melhor de toda a minha carreira (risos). Cobre-me!

O que mudou em você desde sua primeira vitória em Hossegor, na França, em 2005 (pelo WQS, 2ª divisão do surfe mundial), até agora?

Muita coisa. As pranchas melhoraram, aprimorei o meu surfe e também passei a conhecer melhor as ondas dos campeonatos. Acho que isso tudo ajudou para eu ficar melhor e poder disputar um título mundial.

Qual é a importância desse momento para a sua carreira e qual é sua meta para as próximas etapas?

As três próximas etapas serão muito importantes e muito difíceis para manter o meu sonho de ser campeão mundial, pois teremos Fiji (que começa hoje), África do Sul (8 a 19 de julho) e Taiti (14 a 25 de agosto). Tenho que fazer resultados expressivos e acredito que, nesse campeonato, favoritos adormecidos, como Joel Parkison, Kelly (Slater) e o Gabriel (Medina), irão ter bons resultados. Isso fará com que o Mundial, em minha opinião, fique ainda mais acirrado. Eu quero ganhar, ao menos, uma dessas  três etapas, pois ficaria bem e tranquilo. Espero começar com o pé direito em Fiji.

Há um peso 'extra' em usar a camisa amarela (que designa o líder do circuito)? Hoje, em Fiji, quem você enxerga como sua grande ameaça?

Não acredito num peso, mas numa honra. Sei que as pessoas querem derrotar a pessoa de amarelo. Em contrapartida, aumenta o respeito. Em Fiji, todos serão grandes ameaças. Por ser o cabeça de chave numero 1, pegarei um convidado do campeonato (o australiano Adrian Buhan). Isso se torna mais difícil, pois será um expert nesse tipo de onda. Mas, para quem quer ser campeão do mundo, tem que estar pronto para qualquer obstáculo. Eu estou!

Na sua opinião, o que está acontecendo com Gabriel Medina? Hoje ele é apenas o 19º, com 9.200 pontos...

O Gabriel continua sendo um dos melhores do mundo e, com certeza, deverá mostrar ao mundo que ele está de volta nessas próximas etapas. Em 2014, ele ganhou duas (em Fiji e Taiti) das próximas três etapas. Eu  ainda vejo o Gabriel dando uma volta por cima e se tornando um dos favoritos ao título nas próximas etapas do circuito.  Ano passado, ele teve uma grande pressão para ser campeão do mundo e agora talvez ele tenha começado a temporada mais relaxado. Ele vai voltar com tudo logo. Então, tenho que aproveitar e tentar aumentar a diferença enquanto ele não 'acorda'.

Agora, quem lhe ameaça é outro brasileiro: Felipe Toledo. É o mais novo surfista na elite e está na sua cola, após vencer na última etapa, no Rio.

Você viu  o que ele fez? Está surfando muito. Está voando, brother! Adoro o ver surfando. Além disso, é um grande amigo. Torço por ele e espero que  seja campeão do mundo depois desse ano. Por que esse ano, parceiro... Ah! Esse será meu (risos)!

Sua diferença para Filipe poderia ser maior. O que faltou para você na etapa do Rio de Janeiro?

Faltou sorte... queria ter ido mais longe no Rio de Janeiro, mas não deu. Pelo menos, consegui ver todos, mesmo rapidamente. Nós ficamos muito tempo longe da família e todo momento em casa é importante para recarregar as baterias. Acredito que voltarei mais forte agora, após esse período em casa.

Como é a relação entre os surfistas brasileiros? A Brazilian Storm acaba se tornando um time, sempre se apoiando?

Você já disse tudo! Somos uma família, né? Acho que até porque nossa língua é diferente (da que fala a maioria dos outros surfistas), acabamos por ficar mais entre nós mesmo. Mas isso é bom porque nos ajudamos muito. Sempre estamos conversando e falando sobre as condições do mar e o que fazer na próxima bateria. O único problema, mas um problema bom, é que neste começo de temporada estamos nos enfrentando em várias baterias decisivas. Ao meu ver, isso significa que estamos evoluindo no circuito mundial, não é?

O título de Gabriel Medina colocou o surfe em evidência no Brasil. Como você encara esse 'boom' do esporte no país?

Muito bom, né? O Brasil estava carente de ídolos e o Gabriel se tornou um. Fico muito feliz por ele e pelo surfe. Acredito que todos nós surfistas sempre sonhamos em ser reconhecidos profissionalmente e, com o titulo do Gabriel, conseguimos. A final da A etapa do Rio de Janeiro (dia 22 de maio), com mais de 40.000 pessoas, foi um divisor de águas. Mostrou que estamos 'bem na fita'.

Você teme que seja um fenômeno passageiro no surfe? No tênis, por exemplo, depois de Gustavo Kuerten, nenhum outro brasileiro manteve o esporte em alto nível...

Existe sim essa ameaça. Porém, temos grandes atletas que hoje podem suprir uma ausência do Gabriel, por exemplo. Acho que todos os brasileiros que estão na primeira divisão do surfe podem ser campeões de etapas. O Gabriel é muito novo (21 anos) ainda e já é campeão do mundo. O Filipinho é mais novo ainda (18 anos). Temos na geração de base jovens como o Samuel Pupo, Kian e outros. O Brasil está muito bem servido e teremos talentos por muitos anos no surfe.

Imagem ilustrativa da imagem Mineirinho: "Quero aproveitar enquanto Gabriel não acorda"

Kirstin Scholtz | WSL | Divulgação

Como vocês, surfistas, podem usar essa boa fase, o bom momento, para promover o esporte no Brasil?

No momento, não há muito o que fazer além de competir e estar sempre à disposição da mídia para poder mostrar um pouco de quem nós somos e como batalhamos para estar aqui. Muitos acham que, por sermos surfistas, não temos uma vida difícil, mas eu abdico de muita coisa na vida para estar onde estou. Treino todos os dias muito forte. Durmo cedo para acordar cedo e começar os treinos mais cedo ainda. Tenho uma alimentação regrada. Não sei o que é Natal com a família há quase 10 anos. Mas adoro o que faço e não trocaria por nada. Tenho vontade, no futuro, de fazer uma fundação e ajudar crianças com estudos e, é  claro, com muito surfe na veia (risos).

Você despontou muito cedo, com 15, 16 anos. Agora, tem uma molecada que inicia no esporte, mas desiste.

Pois é, acho que muitos desistem por falta de apoio financeiro. A vida não é fácil e é muito importante um suporte. Muitos surfistas talentosos surgem, porém, sem nenhuma ajuda. Às vezes, eles têm que decidir por largar o surfe e ajudar a família em curto prazo. Eles não têm escolha. Isso é uma pena, pois poderíamos ter muito mais Gabrieis, Filipinhos e Mineirinhos pelo Brasil a fora.

Em abril, na etapa de Margareth River, na  Austrália, você venceu e dedicou o triunfo ao seu amigo, o surfista Ricardo dos Santos. Como foi para você receber a notícia de que ele havia sido morto com dois tiros por  um policial militar (Luis Paulo Mota Brentano), em janeiro?

Nossa! Quando me ligaram e me avisaram eu não acreditei. Eu estava em Santa Catarina na época do ocorrido. Quando soube, fui correndo para o hospital e fiquei lá, com esperança de que o Ricardinho iria sair com vida dessa. Foi uma injustiça muito grande e espero ver justiça nesse caso, pois meu grande amigo não mereceu ter uma morte assim. Ele era do bem, uma pessoa maravilhosa, não tinha inimigos. Na verdade, pelo contrário, tinha vários amigos. Ele será agora meu anjo da guarda.

E quando  Mineirinho vem à Bahia? Quais são os 'picos, que gosta ou tem vontade de surfar por aqui?

Pois é, já faz um tempo, né? Quando serei convidado? Eu acho que as praias do Forte (na linha Verde) e da Boca da Barra, em Itacaré,  são as que me vêm na cabeça agora. Alguma mais? A Bahia é linda e tenho que voltar logo. Falta só o convite (risos).

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