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GASOLINA

Novo reajuste da Acelen afetará corridas por app, entregas e inflação

Preços da Refinaria de Mataripe ficaram acima do preço médio nacional praticado pela Petrobras

Por Isabela Cardoso

10/07/2024 - 1:00 h
Posto de gasolina localizado em Amaralina, após reajuste
Posto de gasolina localizado em Amaralina, após reajuste -

Os soteropolitanos foram surpreendidos com um novo aumento no preço da gasolina no início desta semana, realizado pela Acelen, empresa responsável pela Refinaria de Mataripe. E o impacto do cenário de alta tem impacto que vai além do preço encontrado nas bombas dos postos de combustíveis da Bahia. Setores que fazem parte do cotidiano dos baianos, a exemplo da mobilidade urbana e entrega de mercadorias, possivelmente repassarão os custos para os consumidores, alertam especialistas da área econômica.

Um exemplo é o aumento das corridas para táxis e aplicativos de transporte, que atualmente envolvem carros, motos. Sem a transferência de valores para os baianos, o preço praticado pela Acelen também resultaria no colapso de empresas que usam os combustíveis para a prestação de serviços essenciais para a vida moderna, a exemplo das entregas feitas por e-commerce.

“Quando esse custo de cadeia aumenta, todos os ofertantes de produtos e serviços transferem para o consumidor final, de maneira praticamente automática, o custo gerado pelo combustível. Aquele que utiliza o seu próprio veículo vai gastar mais pra se locomover. Os que utilizam sistemas de transporte, como táxi e transporte por aplicativo, certamente sofrerão com o aumento das corridas. O aumento do combustível é sempre utilizado como justificativa para que as empresas pleiteiem junto ao concessor do serviço, no caso, as prefeituras e o poder público”, explica o economista e professor, Antonio Carvalho, em entrevista ao Portal A TARDE.

No caso da ida ao mercado, se a vida não tem sido fácil para o baiano, que tem enfrentado realidades como o recente aumento do preço da cesta básica, ela pode piorar com a manutenção dos aumentos na refinaria privatizada de Mataripe.

De acordo com Antonio, o transporte é a categoria mais significativa no Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA), representando 26% dos custos principais. Com o aumento do combustível, o setor será o mais afetado.

“O mais significativo dos aumentos geralmente se registra no aumento das passagens aéreas e das passagens de transporte urbano e metropolitano. No caso das urbanas, esses ajustes acontecem de forma anual. Mas as metropolitanas, interurbanas e interestaduais sofrem aumentos frequentes cada vez que há um aumento do preço dos combustíveis. Logo, se locomover vai ficar mais caro, vai haver impacto no Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA), ou seja, um impacto na inflação geral sentida no bolso pelo consumidor”, aponta o economista.

O cálculo do IPCA considera produtos como despesas pessoais; artigos de residência; alimentação e bebidas; saúde e cuidados pessoais.

Reajuste da gasolina pode afetar transporte e motoristas por app
Reajuste da gasolina pode afetar transporte e motoristas por app | Foto: Shirley Stolze/Ag A TARDE

Dor de cabeça

Para o motorista comum, o aumento na bomba pode representar um gasto adicional mensal considerável, especialmente para aqueles que dependem do carro para o deslocamento diário ao trabalho ou para atividades básicas.

No caso do baiano que tem o carro como principal meio de trabalho, o presidente da Associação dos Motoristas por Aplicativo da Bahia (AMABA), alerta que o aumento do combustível vai afetar diretamente os profissionais da classe.

"Hoje, temos uma tarifa mínima de R$ 6,50. Essa tarifa não se reajusta quando se tem um aumento como esse, afetando diretamente nos nossos ganhos. Vai afetar quem gosta de pegar o aplicativo onde a empresa repassa um km rodado defasado, uma tarifa defasada. Um km rodado hoje está R$ 1,20. Fica oscilando pra menos, tornando o aplicativo inviável para o motorista. Quem está pagando toda essa conta são os motoristas por aplicativo, depreciando o seu veículo", ressalta.

O presidente da AMABA pontuou também que a categoria pode chegar a paralisar em algum momento. "A gente vai deixar de alimentar uma cadeia porque hoje nós aquecemos a economia do nosso país, do nosso estado, da nossa cidade. A categoria vai parar de um jeito ou de outro. Se esse aumento permanecer, vai trazer um grande desemprego que já há aqui na nossa cidade. Precisamos relembrar que o aplicativo surgiu justamente por uma deficiência do emprego", completa Douglas.

Quase faltou combustível
Em abril deste ano, dias após um reajuste de 5,1% para as distribuidoras, o Sindicato dos Petroleiros da Bahia (Sindipetro-BA) compartilhou uma denúncia que destacou a possibilidade de faltar combustível na Bahia por deslizes da Acelen.

Em nota, a Acelen admitiu que a produção foi reduzida. A empresa reiterou que adotou todas as medidas possíveis para reduzir a possibilidade de impacto no fornecimento dos produtos ao mercado, o que incluiu compra de carga extra de GLP para reforçar os estoques e suprir o fornecimento durante a parada não-programada.

Leia também:
>>> "Verdadeira vilã é a Uber": motoristas reagem a aumento da gasolina
>>> Alta de dólar pode aumentar preço da gasolina e produtos de consumo

No caso do aumento recente, a Acelen informou o reajuste da gasolina de 3,1% para as distribuidoras, que passou a valer no último dia 4. Esse aumento, segundo a companhia, segue critérios de mercado, considerando variáveis como custo do petróleo, que é adquirido a preços internacionais, dólar e frete, podendo variar para cima ou para baixo. A Acelen diz que possui uma política de valores transparente, com medidas técnicos, de acordo com as práticas internacionais de mercado.

Ao longo de 2023, o preço da gasolina na Bahia praticado pela Acelen ficou acima da referência de a Paridade de Preço Internacional (PPI) calculado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em quase todos os meses do ano, refletindo as flutuações do mercado internacional no mercado baiano.

>>> Acelen aplica maior aumento da gasolina das últimas seis semanas

Com isso, os preços da Refinaria de Mataripe ficaram acima do preço médio nacional praticado pela Petrobras por cerca de seis meses, durante o primeiro trimestre e, depois, entre julho e início de outubro de 2023. No fim de 2023, o preço médio da gasolina da Acelen fechou em R$ 2,71 por litro, enquanto o PPI estava em R$ 2,74. Na semana de 22/01/2024, os preços da Acelen (R$ 2,83/L) continuavam cerca de R$ 0,10 abaixo do preço de referência do PPI (R$ 2,93/L), e muito próximo do preço médio nacional praticado pela Petrobras R$ 2,84.

Entenda a política de preços
Em nota, o Sindicato do Comércio de Combustíveis, Energias Alternativas e Lojas de Conveniências do Estado da Bahia (Sindicombustíveis) explicou que, atualmente, a Acelen e a Petrobras possuem políticas de preços diferentes.

Até maio de 2023, as empresas tinham como parâmetro a Paridade de Preço Internacional (PPI). A estatal decretou o fim do PPI e anunciou uma nova estratégia comercial, que leva em conta “o preço mínimo que a Petrobras considera vender e o preço máximo que o cliente se dispõe a pagar”.

No entanto, a Acelen continua com a mesma estratégia de precificação dos seus produtos com base na PPI do mercado europeu e americano, com uma periodicidade dos ajustes que sempre foi diferenciada, afirma a nota. A Petrobras ajusta seus preços em prazos muito alongados sem uma cronologia definida, enquanto a Acelen ajusta semanalmente.

Embora o Brasil seja um grande produtor de petróleo, há no setor uma categorização/tipologia de petróleo, de acordo com os especialistas. O economista Antonio explica que existem diversos tipos, adequados para produção de diesel e outros para produção de gasolina. Dessa forma, nenhum país do mundo produz os dois tipos, o que obriga de maneira geral a existência do comércio internacional de petróleo, ou seja, o país exporta o excedente do tipo que produz e é obrigado a importar o tipo que não produz.

Por isso, a prática da paridade internacional é praticada pela maioria dos países e aqueles que abandonaram, a exemplo da Venezuela, pagaram um alto preço. Ou seja, desvalorizaram artificialmente a commodity e prejudicaram a economia, afirma Antonio.

Refinaria Mataripe
Refinaria Mataripe | Foto: Divulgação | Acelen

"A decisão do Brasil, em relação a Petrobras é uma posição do governo Lula, que considera esse efeito do câmbio uma penalização para os brasileiros. É uma boa decisão, desde que não comprometa demasiadamente o lucro da companhia, já que o principal acionista é o Estado Brasileiro, assim, mais lucro da estatal significa mais dividendos para o Estado, logo, maior capacidade de investimento e realização de políticas públicas. Porém, mesmo sem seguir o preço internacional, a petrolífera é obrigatória a, de tempos em tempos, reajustas (para maior ou para menor) o preço do petróleo em virtude dos custos de aquisição/importação, influenciado pela cotação global e pelo câmbio", destaca o profissional.

>>> Contrato obriga Acelen a manter abastecimento, revela sindicato
>>> Risco de falta de combustíveis já estampou páginas de A TARDE; veja

Em contrapartida, Evaristo Pinheiro, presidente da Refina Brasil, que representa 20% do mercado do refino privado nacional, disse que o descolamento do preço internacional da Petrobras é ilgeal e fere a Lei das Estatais. A legislação determina que políticas públicas feitas com empresas estatais deveria ser objeto de ressarcimento pelo Tesouro Nacional à Petrobras.

"Quando a Petrobras fornece petróleo às refinarias privadas ela não o faz nas mesmas condições de fornecimento às suas refinarias e, quando vende o insumo, faz a preço internacional. Assim, há uma discriminação que afeta os preços finais. E, no fim, as condições de venda do PPI são o preço de mercado justo, mas as refinarias privadas não conseguem manter a paridade quando a Petrobras apresenta diferenças significativas em relação ao PPI", relata Pinheiro.

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