Rio Vermelho: bares transformam a vida dos moradores num 'inferno' | A TARDE
Atarde > Bahia > Salvador

Rio Vermelho: bares transformam a vida dos moradores num 'inferno'

Reportagem do Portal A Tarde acompanhou a rotina estressante de quem vive ao lado do caos

Publicado sexta-feira, 19 de janeiro de 2024 às 12:00 h | Atualizado em 19/01/2024, 12:09 | Autor: Leo Moreira
Moradores dizem que não tem hora para 'paredões dos ricos' começar
Moradores dizem que não tem hora para 'paredões dos ricos' começar -

Morar em frente à praia é um sonho para a grande maioria das pessoas, mas é um privilégio de poucos. Esse é o caso dos moradores da Rua Barro Vermelho, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador, que sentem a brisa do mar da Praia do Buracão invadir suas residências. No entanto, o que tinha tudo para ser um paraíso no meio de Salvador, tem se transformado num verdadeiro inferno provocado por bares instalados ao lado dos imóveis residências.

De acordo com as denúncias, dois estabelecimentos, o Principote e o Blue Praia Bar, estão violando regras básicas e emitindo poluição sonora quase que diariamente. Diante dos relatos, a reportagem do Portal A Tarde acompanhou durante um fim de semana a rotina das pessoas que escolheram a rua, até então, pacata e tranquila para residir.

Morador da localidade há mais de 10 anos, Miguel Sehbe, acompanhou de perto várias mudanças no bairro e diz que a barulheira parece não ter fim. "O pior é que é constante, é intermitente, é como se fosse o compressor ligado o dia inteiro. Parece aquela marcha do soldadinho, sabe? Quando faz aquela batida 'Puxi bubuxi bubuxi bubuxi bubuxi'. É o paredão de rico, porque proibiram todas as barracas de praia de pobre", disse o advogado, que alega ter tentado uma solução pacifica, mas sem êxito.

"Já falei com o dono diversas vezes. Não foi nenhuma, nem duas vezes. Então, imagina como é que a gente pode conviver com alguma coisa nesse sentido? Deixa qualquer um neurótico. Porque não é possível aguentar. Não tem saúde mental que aguente. É impossível", conta Miguel ao mostrar o evento que acontecia no momento. O relato detalhado faz referência ao Bar Principote, que fica 'colado' com sua residência.

Principote Salvador 

Principote
Principote |  Foto: Divulgação

O incômodo é tanto que Miguel Sehbe se juntou com um grupo de moradores e contratou um profissional para medir os decibéis emitidos pela casa. Na ocasião, a reportagem acompanhou o estudo técnico realizado por Michel Cruz Costa de dentro da casa de Miguel. Durante o período de aferição, o índice quase sempre ultrapassou os 70 decibéis permitidos por lei até às 22h. Os picos chegaram a superar os 110 decibéis, como explica Michel.

"A gente fez toda ela baseada na metodologia da NBR 10151, que determina o tipo de equipamento, a calibração que deve ser feita para esse tipo de monitoramento. Os resultados encontrados nesse monitoramento foram de 70,18 com um pico de 118,69. Inclusive, teve outro monitoramento que a gente fez que deu um resultado acima do limite, dando um valor de 73,84, quase 4 decibéis acima do limite, permitido conforme a lei orgânica do Estado. Se foi quadrado conforme a NBR, essa situação se agrava mais ainda, porque como o limite seria de 55 decibéis, estaria aí a mais de 15 decibéis acima do limite", explicou.


A Lei Municipal 5.354/1998, que dispõe sobre a utilização sonora na cidade, permite a emissão de ruídos com níveis até 70 decibéis, no período das 7h às 22h. Após esse horário, a tolerância é reduzida para 60 decibéis, limite que deve permanecer até às 7h. O volume é medido na distância de 2 metros dos limites da origem do som.

Guiomar Germani mora no sétimo andar de um edifício que fica do outro lado do estabelecimento, ainda assim sente os efeitos dos barulhos. "É esse 'baticum' constante, mesmo com janela fechada a gente escuta esse barulho constante. Tenho certeza que este é um estabelecimento fora do lugar. Uma casa de eventos toca isso o dia inteiro no meio de residências".

Após a medição, a reportagem 'bateu na porta' do restaurante Principote para ouvir a versão dos responsáveis, porém, após um longo período de espera, o estabelecimento disse que se posicionaria por meio da assessoria de comunicação, o que não aconteceu.

Medição ultrapassou os 70 decibes permitido por lei
Medição ultrapassou os 70 decibes permitido por lei |  Foto: Leo Moreira / Ag. A Tarde

Denúncias

De acordo com Miguel, ele já realizou diversas denúncias contra o Bar Principado em relação ao alto som emitido pelo estabelecimento. As queixas foram direcionadas à Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur). A reportagem teve acesso algumas desses documentos e procurou a secretaria para um posicionamento.

Em nota, a assessoria de comunicação disse que "a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano informa que os estabelecimentos possuem Autorização de Utilização Sonora. O órgão realizou vistoria no local e notificou os estabelecimentos para obedecerem aos níveis sonoros permitidos por lei. A Sedur segue monitorando a situação".

Blue Praia Bar

Imagem ilustrativa da imagem Rio Vermelho: bares transformam a vida dos moradores num 'inferno'

'Bem na fita' nas redes sociais e figurando em grandes revistas de Turismo, a imagem do Blue Praia Bar não é a mesma entre alguns moradores do bairro. Galdino, que mora no prédio vizinho, diz que a barulheira não tem hora para começar ou acabar. Ao todo, eles alegam ter realizado mais de 30 denúncia e B.O a respeito de poluição.

"O som às vezes começa 8h30 da manhã e não tem um horário fixo para acabar. Às vezes, vai até às 22h. Terça-feira passada, por exemplo, eram 10 horas da noite e nós estávamos medindo no decibelímetro em torno de 102, 110 decibéis. Hoje está mais baixo, só que tem que considerar que isso é o dia inteiro, começa às 8h30 da manhã e vai até a noite, então para quem mora aqui é insalubre, nós temos idosos, nós temos crianças, nós temos grávidas, a pessoa não consegue trabalhar em casa. Quem trabalha em home office não consegue estudar, não consegue assistir à televisão", explanou.

Já Bruno Edelweiss, que mora lado a lado com o Blue, diz que a barulheira é tão grande que coisas básicas, como trabalhar de home Office ou assistir TV ficam impossíveis de serem feitas de dentro de sua própria casa.

"Por conta da pandemia eu precisei da infraestrutura criada para a continuidade do trabalho, trabalhar em casa, em home office. Eu não consegui. Eu tive que parar de atuar em home office, porque você não pode fazer uma reunião online. Você não pode atender uma ligação, porque acham que você está numa boate. De dentro da sua casa, na sala da sua casa, parece que você está numa boate, ninguém te leva a sério. Então, impediu a continuidade do meu trabalho por esse ambiente insalubre que a gente é compulsoriamente obrigado a conviver. Inclusive, muitas vezes, costumeiramente, a gente volta do trabalho numa sexta-feira, final de tarde, querendo descansar de uma semana dura de trabalho", relatou.

No mesmo dia, a reportagem também acompanhou uma medição realizada por Michel, desta vez, na residência de Bruno, que fica ao lado do Blue Praia Bar. Na ocasião, os limites de som foram abaixo dos 70 decibéis, ou seja, estava dentro do regulamento, o que seria uma raridade, segundo Galdino.

Michel explica que, mesmo abaixo dos limites permitidos por lei, pode ser enxergado como uma irregularidade devido à frequência. "A depender do caso, o Ministério Público ou algum outro órgão pode querer enquadrar os limites da NBR. Nesse caso. Nesse caso, aqui, o limite da NBR, como é uma área residencial, é de 55 decibéis para o período de junho e de 50 decibéis para o período de outubro".

O Portal A TARDE conversou com o proprietário do Blue que disse lamentar o incômodo causado, mas alegou agir tudo dentro do regulamento. "A gente sempre tira os alvarás que nos permitem e a gente atua dentro do que é permitido de controle de som também", disse Serginho.

Confira a medição:


Publicações relacionadas