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Quadrinhos são “baixa literatura”? Membro da ALB comenta polêmica
Escritor pontua que tem pessoas que deixam de consumir coisas boas porque acham que não é para elas
Por Edvaldo Sales
Existe alta e baixa literatura? Essa é uma pergunta que vira e mexe surge em rodas de conversa e discussão sobre livros. Normalmente, as pessoas classificam como “alta literatura” aquelas obras clássicas e difíceis de ler — e que são comumente apresentadas aos adolescentes no ensino médio. Já a “baixa literatura” seriam aquelas mais populares, comerciais e que encabeçam as listas dos livros mais vendidos. No centro desse debate, outra polêmica ganhou destaque: as histórias em quadrinhos são literatura?
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Existem divergências sobre isso. Em 2023, por exemplo, o jornalista James Akel, que disputou a cadeira número oito da Academia Brasileira de Letras (ABL) com o cartunista Maurício de Sousa, afirmou que os quadrinhos estão no campo do entretenimento, e não da educação ou literatura. “No dia em que acabarem os livros, acabou a literatura”, disse Akel.
Nesse cenário, há também quem coloque os gibis na prateleira da “baixa literatura”, mas tem quem discorde disso, como é o caso do escritor e membro da Academia de Letras da Bahia (ALB), Marcus Vinícius Rodrigues, que conversou com o Portal A TARDE sobre o tema. Segundo ele, “a gente pode pensar em boa literatura no sentido de que funcionou e de que não funcionou”.
“Às vezes tem um romance visto como alta literatura, mas ele não funciona, ou ele não é escrito bem o suficiente para ser bem visto. E aí você vê uma história da cultura pop, como quadrinhos da Marvel, para dar um exemplo do que eu gosto, e que tem uma qualidade narrativa muito grande”, disse.
Intercambiamento
Marcus Vinícius destacou o intercâmbio que existe entre as duas coisas. “Nos quadrinhos, muitas das vezes, você tem uma adaptação de Shakespeare em uma narrativa de super-herói”, pontuou.
Na ocasião, ele relembrou uma polêmica que envolve o cantor Zé Ramalho e um quadrinho do Incrível Hulk. Em 1982, o artista lançou o LP ‘Força Verde’, no qual a letra da faixa-título é um plágio da tradução brasileira para um poema do dramaturgo e poeta irlandês W. B. Yeats. A versão brasileira foi publicada em 1972, no gibi ‘O Incrível Hulk # 1’, pela editora GEA.
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Na HQ, o roteirista Roy Thomas usou o poema como narração nas primeiras páginas da história, mas sem citar o poeta. Já Zé Ramalho, que é fã de quadrinhos, usou a tradução também sem dar créditos ao W. B. Yeats ou à Marvel.
“Tem uma coisa que eu dou muito como exemplo que é um caso de plágio do Zé Ramalho. Ele tem uma música chamada ‘Força Verde’, linda, que, na verdade, é um plágio de um texto de uma história do Incrível Hulk. E aí, a Marvel não processou o Zé Ramalho, porque, na verdade, aquele texto da revista do Incrível Hulk é do poeta inglês William Butler Yeats e a revista não colocou crédito”, detalhou o membro da ALB.
Marcus Vinícius continuou: “Existe esse intercâmbio entre a alta literatura inglesa, quadrinhos e a música popular. Está tudo interligado. Nas literaturas — e eu estou tratando de quadrinhos como literatura, embora ela seja outra coisa, nem melhor nem pior, mas outra coisa, porque tem o visual também —, está tudo intercambiado”.
Às vezes você tem algo de muita qualidade na cultura pop, que é visto como baixa literatura, e você tem coisas que são incensadas na literatura, e se você for parar para pensar, não é de tão boa qualidade assim.
Além disso, o autor enfatizou que “tem alguns escritores contemporâneos, por exemplo, que são classificados como geniais, incríveis, e talvez não seja tudo isso”.
“É muito complicado fazer essa distinção. E tem pessoas que deixam de consumir coisas boas porque acham que não é para elas. Isso dos dois lados. Tem gente que só quer consumir os grandes livros e filmes e perde grandes histórias na cultura pop. E tem jovens que só consomem cultura pop e não sabem que estão consumindo Homero, Shakespeare e Sófocles retrabalhados naquelas histórias”, completou.
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